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PRIMEIRO DOMINGO DO ADVENTO (Ano A) – P. Lucas, scj

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Caros irmãos, com o primeiro domingo do Advento, iniciamos um ano litúrgico, o ano A, e a liturgia nos ajuda a meditar sobre a vigilância, característica essencial da vida cristã (cf. Mt 24,37-44). Que o Espírito Santo nos conduza a uma verdadeira conversão.

Neste mundo, não podemos viver despreocupadamente como a geração de Noé: envolvidos pelas vicissitudes da vida cotidiana, eles foram surpreendidos pelo dilúvio (cf. Mt 24,38-39). Pelo contrário, nós devemos estar sempre preparados, pois o Senhor vem (cf. Mt 24,44). Para tanto, podemos pedir o auxílio da Bem-aventurada Virgem Maria, cuja memória de N. Sra. das Graças coincide com o primeiro domingo do advento: que sentimentos de amor expectante não invadiram seu imaculado coração depois do anúncio do arcanjo?

Concretamente, preparamo-nos para a chegada do Senhor voltando-nos para Ele e abrindo-nos para receber Suas instruções. De fato, Deus mesmo nos ensina seus caminhos e nos capacita para cumprir Seus preceitos (cf. Is 2,3) enquanto nos reveste com o Senhor Jesus Cristo (cf. Rm 13,14). Portanto, intensifiquemos a nossa vida de oração, em particular a meditação da Palavra de Deus, abramos nosso coração ao arrependimento e, confessando nossos pecados, abramo-nos à vida daquele que vem hoje misteriosamente para que não sejamos surpreendidos em Sua vinda derradeira.

Pai, dá-nos o Espírito Santo para que abramos o coração sem reservas ao Teu Filho Jesus Cristo. Virgem Maria, Senhora das Graças, ensina-nos a cumprir a vontade Deus. S. José, nosso protetor, leva-nos a intimidade com Jesus.

Sub tuum præsidium confugimus.
sancta Dei Genitrix:
nostras deprecationes
ne despicias in necessitatibus:
sed a periculis cunctis libera nos semper,
Virgo gloriosa et benedicta.

I Domingo do Advento: Mt 24,37-44

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Por Dom André Vital Félix da Silva, SCJ.

Neste tempo santo do Advento a Igreja reza: “Revestido da nossa fragilidade, Ele veio a primeira vez para realizar seu eterno plano de amor e abrir-nos o caminho da salvação. Revestido de sua glória, Ele virá uma segunda vez para conceder-nos em plenitude os bens prometidos que hoje, vigilantes, esperamos” (Prefácio Advento I). Nestas palavras, encontramos a síntese completa da teologia e espiritualidade do Advento; é tempo de preparação para fazer memória da primeira vinda de Cristo (advento natalino), mas também é celebração vigilante e jubilosa que proclama a sua vinda definitiva na glória (advento escatológico). Porém, não há um hiato entre a primeira e a segunda vindas de Jesus, pois Ele não é um simples personagem da nossa lembrança, nem muito menos um ausente aguardado com ansiedade. Por isso, também rezamos: “Agora e em todos os tempos, Ele vem ao nosso encontro, presente em cada pessoa humana, para que o acolhamos na fé e o testemunhemos na caridade, enquanto esperamos a feliz realização do seu Reino” (Prefácio Advento I/A).

Neste I Domingo do Advento, a liturgia nos indica qual deve ser a atitude mais coerente e profícua para vivenciarmos bem este tempo de preparação: “Vigiai, porque não sabeis em que dia virá o Senhor”. A vigilância na Sagrada Escritura é a atitude de quem está atento aos acontecimentos da vida, sabe ler neles os apelos de Deus e está em permanente estado de espera, por isso, é capaz de reconhecer que o Senhor vem constantemente, independe das diversas maneiras de Ele se fazer presente. Por conseguinte, esperar não significa acomodar-se; esperar pelo Senhor não deve ser um pretexto para cruzar os braços. Destarte, o sinal seguro de vigilância é uma atitude operante: “Dois homens estarão trabalhando no campo … Duas mulheres estarão moendo no moinho”. Contudo, não há um lugar especial e exclusivo, nem uma atividade particular e específica que garantem a autêntica vigilância ou a adequada preparação para o encontro com o Senhor. A diferença está na atitude interior de atenção que leva a discernir a sua presença.

Jesus ilustra o seu ensinamento sobre a vigilância evocando a figura de Noé, o último patriarca antes do dilúvio, símbolo do homem justo porque está atento à voz de Deus, diferente da sociedade do seu tempo desatenta, dissoluta e alienada diante de suas opções. Noé é visto também na Sagrada Escritura como instrumento de Deus para salvar a humanidade e, ao mesmo, é figura do novo começo, da criação restabelecida. O seu próprio nome (hebraico, Noah) tem conotação de descanso, consolação e salvação (de nuahnâham: Gn 5,29), por isso ele está entre os vários tipos transitórios do Antigo Testamento que anunciam o definitivo, isto é, o Messias. 

Assim como Noé passou 40 dias dentro da arca a fim de que a criação fosse salva e renovada, Jesus fez o seu tempo de preparação durante os 40 dias no deserto, precedido pelo seu batismo, símbolo do novo dilúvio e realização do novo êxodo, a partir do qual Deus refaz toda a sua criação no seu Filho amado (cf. 1Pd 3,20). Assim como Noé foi chamado para estabelecer com Javé uma aliança, garantia de que Deus não destruiria mais a terra, com Jesus, Deus estabeleceu a nova e eterna aliança, através da sua cruz, constituída a nova e definitiva arca da salvação (cf. Ef 2,16).  Assim como Noé, depois da purificação da humanidade com o dilúvio, plantou a vinha a fim de alegrar, com os seus frutos, o coração humano (Gn 9,20), o novo Noé declara-se a videira verdadeira, que dá frutos não apenas para a alegria passageira do ser humano, mas dá a verdadeira vida aos que nela forem enxertados (cf. Jo 15,1s).  

A cegueira do ser humano dos tempos de Noé, de Jesus e de hoje continua a mesma: enxerga muito pouco da vida, pois limita-se apenas, na maioria dos casos, ao que come ou bebe (vida puramente animal), ou mesmo aos seus projetos temporais (casar-se e dar-se em casamento). Vigiar significa reconhecer que a vida é chamada à plenitude que ultrapassa os limites da existência terrena; vigiar é reconhecer que palmilhar essa estrada rumo à plenitude é deixar-se guiar por Aquele que, sendo Deus, se fez homem e, por isso, se faz caminho seguro, pois é presença constante, é o Emanuel, o Deus conosco cuja primeira vinda celebramos com gratidão e cuja vinda definitiva aguardamos com esperança e alegria. Porém, Ele espera de nós que estejamos sempre vigilantes para o acolhermos a cada momento, em cada semelhante. Advento é tempo pedagógico para fazer esse caminho!!!

Fonte: https://www.dehonianosbre.org.br/homilias/i-domingo-do-advento–mt-24-37-44

SOLENIDADE DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO, REI DO UNIVERSO (Ano C) – P. Lucas, scj

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Caros irmãos, no último domingo do Tempo Comum, a liturgia nos leva a rezar com a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo que, neste Ano C, nos apresenta a cena da crucifixão do Senhor segundo S. Lucas (cf. Lc 23,35-43). Que o Espírito Santo nos dê a graça de acolher o Rei e Seu Reino.

Habitualmente fora do nosso horizonte de consciência, um rei é o último responsável pelo bem de uma sociedade e, por isso, ele possui a máxima autoridade e o máximo poder. Contemplar Jesus Cristo como Rei do Universo significa, dessa forma, reconhecer que tudo existe nele e para Ele; que Ele é a cabeça da Igreja e o primogênito dentre os mortos (cf. Cl 1,16-18 – segunda leitura). E, porque Seu Reino não é deste mundo (cf. Jo 17,15-16), Ele se deu a conhecer plenamente na Cruz, onde foi reconhecido pelo bandido que se arrependeu (cf. Lc 23,42 – evangelho).

Justamente na Cruz! Momentos antes de morrer, Jesus é reconhecido como Rei pois ali, dando Sua vida por nós e sofrendo as consequências dos pecados que cometemos, Ele manifesta o profundo mistério do Amor de Deus. Por isso, Ele é digno de receber toda nossa confiança para que nos apascente e seja nosso chefe (cf. Sm 5,2 – primeira leitura). De fato, Cristo pode reinar em nosso coração se, recebendo nossa confiança, Ele nos instruir e configurar à vontade de Deus. Portanto, busquemos o Reino de Jesus Cristo, abrindo-nos ao Seu amor e deixando-nos transformar inteiramente de acordo com a Sua vontade.

Ó Pai, envia-nos o Espírito Santo para que Teu Filho Jesus Cristo reine em nosso coração. Virgem Maria, Mãe de Deus e nossa, ensina-nos a fazer a vontade Deus. S. José, nosso protetor, dá-nos a intimidade com Jesus.

Sub tuum præsidium confugimus.
sancta Dei Genitrix:
nostras deprecationes
ne despicias in necessitatibus:
sed a periculis cunctis libera nos semper,
Virgo gloriosa et benedicta.

Solenidade de Cristo Rei: Lc 23,35-43 – Insultas ou defendes o teu Rei?

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Por Dom André Vital Félix da Silva, SCJ.

A Solenidade de Cristo, Rei do Universo, mais do que marcar o término do Ano Litúrgico, é anúncio profético da conclusão de toda a história: Aquele que se ofereceu na cruz, vítima pura e pacífica e realizou a redenção da humanidade, entregará ao Pai um reino eterno e universal (Prefácio da Solenidade de Cristo Rei). Portanto, tudo se encaminha para o definitivo estabelecimento do Reino de Deus. A cada Eucaristia anunciamos esta verdade e renovamos o nosso compromisso de colaborar com a instauração desse Reino. O Reino de Deus não é mais uma utopia que pretende enganar a humanidade a fim de que ela não enlouqueça diante da sua impotência de fazer acontecer, no aqui e agora, as suas aspirações de justiça, paz, igualdade, etc.

O cristão autêntico não se pergunta se o Cristo vencerá ou se ainda há esperança de que Ele reine. O verdadeiro discípulo do Mestre não tem dúvida de que Ele já é vitorioso, e que o seu reinado já foi inaugurado: “Hoje estarás comigo no paraíso”. Por outro lado, anunciar a vitória de Cristo Rei é optar pelo seu caminho e destino; é vencer a tentação de ficar apenas assistindo passivamente à sua luta, ou mesmo, diante do desânimo e frustrações humanas, passar para o outro lado, tornando-se um adversário dele, colaborando com o antirreino. A cruz de Jesus não é apenas instrumento de suplício, mas prova da sua fidelidade ao Pai, confundindo os seus opositores. A cruz é o trono do qual Ele exerce a sua suprema autoridade, não abdica do seu poder real, mas o manifesta sobretudo no perdão e na misericórdia para aqueles que o reconhecem, apesar de seu sofrimento, como Salvador da humanidade.   

Nas atitudes e reações daqueles que estavam presentes no calvário, Lucas nos apresenta, num movimento crescente, os três graus de cumplicidade na execução da morte de Jesus, ápice da rejeição à sua pessoa e ao seu projeto de vida. Parte-se da incredulidade dos chefes do povo, passando pelo escárnio dos soldados, até culminar na blasfêmia proferida por um dos malfeitores pendentes da cruz. Essas três reações, na verdade, são as últimas tentativas (tentações) de convencer Jesus de trair o projeto do Pai, negando a sua encarnação e fazendo-o romper definitivamente com a sua missão de Messias Sofredor. 

No início do evangelho, Lucas finaliza a narração das tentações afirmando: “Tendo acabado toda a tentação, o diabo o deixou até o tempo oportuno” (grego: kairós, Lc 4,13). Eis, portanto, o tempo oportuno, o momento decisivo para Jesus testemunhar a sua fidelidade ao Pai e ao seu projeto de salvação. 

Assim como o diabo introduzia suas propostas tentadoras com a expressão: “Se és Filho de Deus”, os chefes, os soldados e o malfeitor também fazem referência aos títulos de Jesus (Filho de Deus, Rei dos Judeus, Messias). Tanto o diabo como os outros exigem que Jesus dê provas disso. Para o diabo, a prova era usar a sua prerrogativa divina em benefício próprio, isto é, matar a própria fome; para os chefes, ser filho de Deus era salvar-se a si mesmo. Esse é o primeiro grau de cumplicidade com o projeto do diabo: exigir que o Messias não seja o servo sofredor, e por isso não acreditam que aquele crucificado, coberto de dores, fosse o Messias. Eis por que “ridicularizavam-no (grego: eksemuktérizon, contorcer o nariz, virar-se para não ver, caçoar): a outros salvou, que salve a si mesmo, se é o Messias de Deus, o Eleito”. Os primeiros que deveriam ter reconhecido Jesus como o Messias fazem dele objeto de riso (brincadeira), não veem que o crucificado é o Deus encarnado que levou a sério a sua missão, até as últimas consequências, não permitindo que as pessoas fossem tratadas com menosprezo, tornando-se, assim, o defensor dos postos à margem. 

Se o diabo prometeu a Jesus dar-lhe todos os reinos da terra, os soldados insultam Jesus ironizando com o título de “Rei dos Judeus”. Esse é o segundo grau de cumplicidade com o projeto do diabo: “traziam-lhe vinagre, e diziam: Se és o Rei dos Judeus, salva-te a ti mesmo”. Àquele cuja dignidade real duvidam, oferecem a bebida dos miseráveis (vinagre: vinho podre), e assim reiteram que o crucificado não pode ser um rei, pois não tinha nem reinos nem poderes, visto que quando teve a oportunidade de recebê-los (do diabo), recusou. Na última tentação, o diabo sugere a Jesus, apoiando-se na Escritura, reivindicar toda isenção de dificuldade e problema, pois sendo um protegido de Deus, nada o poderia atingir, e caso se encontrasse em situações adversas, o Altíssimo enviaria os seus anjos para livrá-lo. Esta é a mentalidade do malfeitor, a sua blasfêmia representa o terceiro grau de cumplicidade com o projeto do diabo: “Não és tu o Messias? Salva-te a ti mesmo e a nós”. Assim como o diabo foi derrotado no início da vida pública de Jesus, tal derrota é confirmada no julgamento da cruz. Portanto, as palavras do bom ladrão representam a grande proclamação desse julgamento: “Ele não fez nenhum mal”. Pedro, no seu discurso na casa de Cornélio, dirá: “Como Deus o ungiu (Messias) com o Espírito Santo e com poder, ele que passou fazendo o bem” (At 10,38s). Eis a grande prova de que Jesus é o Messias, o Eleito de Deus. Participar do seu Reino é proclamar essa verdade e comprometer-se com ela. Enquanto todos os opositores exigiram de Jesus que abandonasse a cruz e desse provas de que era o Messias, o Filho de Deus, o bom ladrão, pregado na cruz, reconhece quem é aquele que está ao seu lado: “Jesus” e, por isso, faz-lhe um pedido para permanecer sempre do seu lado: “lembra-te de mim quando estiveres no teu reinado”. 

Enquanto os adversários se dirigiam a Jesus usando ironicamente os seus títulos, o bom ladrão dirige-se a Ele, chamando-o por seu nome, isto é: “Deus salva” (Jesus), grande proclamação de fé, diante da incredulidade dos chefes, dos soldados e do malfeitor que acreditavam que Jesus só poderia salvar abandonando a cruz, fugindo da morte. Assim como o tentador, todos os adversários do Reino querem um Jesus sem cruz. A tentação de abandonar a cruz torna-se insulto e blasfêmia ao Crucificado. Distanciar-se da cruz é ser impedido de ouvir a grande verdade da sua vitória, da sua ressurreição que alimenta a nossa esperança: “Em verdade vos digo: ‘Hoje mesmo estarás comigo no paraíso’”.

Fonte: https://www.dehonianosbre.org.br/homilias/solenidade-de-cristo-rei–lc-23-35-43–insultas-ou-defendes-o-teu-rei-

TRIGÉSIMO TERCEIRO DOMINGO DO TEMPO COMUM (Ano C) – P. Lucas, scj

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Caros irmãos, na liturgia do trigésimo terceiro Domingo do Tempo Comum, ano C, Jesus convida-nos a voltarmos o nosso coração às realidades que não passam para poder viver as tribulações do tempo presente (cf. Lc 21,5-19). Que o Espírito Santo nos dê a graça de fincar nossos pés na realidade.

Àqueles que se impressionavam com a beleza do Templo, o Senhor mostra como são passageiras as coisas deste mundo: mesmo as mais belas e sólidas encontrarão um fim (cf. Lc 21,6). Além disso, a vida presente será marcada por fatos trágicos e dramáticos que darão oportunidade para falsas profecias e messianismos que nos oferecerão uma salvação imanente e sem cruz. “Não sigais essa gente [… e] não fiqueis apavorados” (cf. Lc 21,8-9).

Pois, como discípulos de Jesus Cristo, trilharemos um caminho semelhante ao dele, Ou seja, o seguimento do Senhor não nos leva a uma via de escape, que passe ao redor das tribulações. Pelo contrário, trata-se de um caminho que nos leva a seguir radicalmente Seus passos, inclusive na oferta da própria vida a Ele. Daremos, assim, o testemunho de nossa fé. “Mas vós não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça”, diz o Cristo (Lc 21,18). Em outras palavras, precisaremos permanecer firmes em Deus (cf. Lc 21,19) porque chegaremos à ressurreição e à vida eterna pela cruz, unidos Àquele que, por nós, foi odiado, perseguido, preso e morto.

Ó Pai, dá-nos o Espírito Santo para que nos tornemos testemunhas de Teu Filho Jesus Cristo em todas as circunstâncias, sobretudo nas mais difíceis. Virgem Maria, nossa Mãe, ensina-nos a perseverar no nosso sim a Deus. S. José, nosso protetor, dá-nos a intimidade com Jesus.

Sub tuum præsidium confugimus.
sancta Dei Genitrix:
nostras deprecationes
ne despicias in necessitatibus:
sed a periculis cunctis libera nos semper,
Virgo gloriosa et benedicta.

XXXIII Domingo do Tempo Comum: Lc 21,5-19 – O fim sem fim

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Por Dom André Vital Félix da Silva, SCJ.

Estamos praticamente chegando ao final de mais um Ano Litúrgico. Um percurso pedagógico-espiritual que nos ajuda a mergulhar no mistério da vida, morte e ressurreição de Cristo, Alfa e Ômega, Princípio e Fim, mas, ao mesmo tempo, ilumina a nossa realidade humana, nas suas dimensões de finitude e eternidade. Portanto, o tema do fim não pode ser estranho ao ser humano, nem muito menos causa de terror e desespero; é uma realidade que não se pode negar. Contudo, na perspectiva cristã, todo fim deve expressar uma finalidade alcançada, e, portanto, marca um novo começo, que não significa um eterno retorno cíclico, mas passagem qualitativa para uma nova realidade que supera todo o vivido até então. 

A perícope evangélica deste XXXIII Domingo do Tempo Comum, penúltimo do ano litúrgico, apresenta um ensinamento de Jesus diante de uma compreensão errada em relação às realidades terrenas. Consciente do iminente fim da sua missão, e utilizando uma linguagem própria (apocalíptica), o Mestre adverte os seus discípulos sobre a missão que irão receber e à qual deverão permanecer fiéis: “É pela perseverança que mantereis vossas vidas”.

Diante da reação de admiração e encantamento de alguns frente à beleza do Templo, ornado de belas pedras e de ofertas votivas, Jesus declara que tudo é passageiro, “não ficará pedra sobre pedra”. Naquele mesmo contexto, encontramos um pouco antes o episódio da viúva que do pouco que possuía para viver, ofereceu tudo (Lc 21,1-4). Jesus, exaltando o gesto dessa pobre viúva, declara qual é a atitude mais coerente de quem entendeu a indiscutível verdade da vida, isto é, que tudo passa. Por outro lado, o evangelista evidencia o contraste entre o olhar de Jesus, que vê as pessoas e as suas atitudes, e o olhar alienado daqueles que só conseguem ver a superficialidade das coisas e, rapidamente, apegam-se à beleza efêmera do Templo, e não conseguem reconhecer o verdadeiro templo que é o coração desprendido de tudo, e que é capaz de ser espaço aberto, tornar-se morada de Deus, a qual não poderá ser destruída. Enquanto o espaço físico do Templo, suas ornamentações, sua beleza material, não existem mais, o gesto generoso da viúva, consciente da sua finitude terrena, não desapareceu, continua vivo, pois tornou-se Boa Notícia, evangelho.

O anúncio profético de Jesus em relação à destruição do Templo historicamente se realizou por ocasião da invasão de Jerusalém por parte dos Romanos (70 d.C.). Quando os evangelhos foram escritos, esse terrível acontecimento estava muito presente na mente e no coração do povo, que buscava explicações não apenas nas causas históricas, mas uma compreensão à luz da fé. Diante das várias especulações do tempo, a comunidade cristã era interpelada a se posicionar e responder se aquilo que estava acontecendo era, de fato, anúncio do iminente fim do mundo. Era urgente fazer ressoar as palavras de Jesus: “Atenção para não serdes enganados…”. Relembrando essas palavras, os cristãos cresciam na convicção de que prever o fim do mundo não era a missão deles, pois esta também não foi a missão do Mestre. Porém, não viviam de forma ingênua negando as vicissitudes do tempo (guerras, catástrofes naturais, perseguições externas e internas), mas fortalecidos pela palavra e exemplo do Mestre não se deixavam enganar por propostas fáceis (abandonar o caminho) ou desencaminhar-se seguindo os “messias da hora” (salvadores da pátria oportunistas, fundamentalistas de plantão), que aproveitam de situações calamitosas para enganar as pessoas aflitas e tirar vantagens da sua fragilidade circunstancial.

Ainda que muitos acontecimentos provocadores de angústia, tristeza, sofrimentos e mortes não tenham uma explicação plausível, a comunidade cristã tem uma firme convicção fundamentada no ensinamento de Jesus: “Não vos atemorizeis; pois é preciso que primeiro aconteça isso, mas não será logo o fim”. Cabe à comunidade fazer o discernimento para não se deixar enganar (grego: planao, ser induzido ao erro, desencaminhar-se. Daí a palavra “planeta”; os antigos astrônomos chamavam de planetas corpos celestes que se movimentavam, isto é, errantes, porque os via deslocar-se no espaço sideral como se estivessem perdidos). Diante de intensos sofrimentos, abalos emocionais, o ser humano tende a perder o rumo, vagar sem direção. Contudo, os discípulos de Jesus não são planetas (errantes), mas devem ser bússola que ajuda a não perder o seu destino e, por isso, não temem a perseguição tanto religiosa (sinagogas) quanto política (reis e governadores), nem mesmo a traição dos seus mais próximos (pai, mãe, irmãos, parentes, amigos) por causa de sua fidelidade a Cristo. Não vagueiam ao sabor das ondas porque estão enraizados na certeza de que tais ocasiões são as molduras mais propícias para o autêntico testemunho: “Isso vos será ocasião de testemunho (grego: martiria)”.

A suficiente defesa diante dos adversários não dependerá da eloquência humana, mas da sabedoria da palavra de Deus que lhes foi dada e que eles cultivam nos seus corações: “Eu vos darei eloquência (grego: stoma, boca – símbolo da profecia) e sabedoria” (grego: sofia, conhecimento a partir da experiência).

A chegada do final do ano litúrgico se reverte em aurora de novo ano, com o tempo do advento, onde a esperança se renova com a vinda do Messias que nunca se ausenta, mas que sela a sua presença constante através do seu Mistério Pascal, onde o infinito toca o finito, e o fim torna-se sem fim.

Fonte: https://www.dehonianosbre.org.br/homilias/xxxiii-domingo-do-tempo-comum–lc-21-5-19–o-fim-sem-fim